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T&Q - a foda d'ouro 86

tal & qual, 4 novembro 1987

 

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Foliões queriam pregar partida a Mario Soares

 

Um grupo de intelectuais portugueses, residentes em Paris, foliões e malandrecos quanto baste, resolveu pregar ao Dr. Mário Soares a partida da sua vida: entregar-lhe, com toda a pompa e cerimónia, i impagável galardão “F.O.D.A. d´Ouro /86”, falaciosamente destinado a premiar quem se notabiliza na defesa do albatroz – uma ave de mar-alto que marujos de todo o mundo se habituaram a tratar como companheira fiel de longas navegações. Felizmente para o chefe do Estado, a brincadeira não era fácil de levar a cabo…

Ninguém confessa a autoria da ideia, mas foi o português Carlos Laidevide, presidente da divertida “ Fondation Occidentale pour la Défense des Albatros” (que gosta de se apresentar com as singelas iniciais F.O.D.A.) quem escreveu de Paris ao deão da Universidade de Estudos estrangeiros de Hankuk, de Seul (Coreia do Sul) sugerindo que o dr. Mário Soares merecia mais do que o titulo de “Doutor Honoris Causa” que aquela instituição se preparava para entregar ao presidente português. A sua carta, usando um humor que os sul-coreanos não detetaram por detrás do relato aparentemente sério, é um delírio de imaginação: “ Se o presidente Soares merece toda a espécie de condecorações pela sua defesa empenhada dos Direitos do Homem, merece-as dez vezes mais pela sua atividade em favor dos direitos dos animais indefesos, e muito particularmente pela sua ação em favor do albatroz, esse adorável palmípede”.

Em papel timbrado da F.O.D.A. ( cuja “sede” é; evidentemente, um apartado postal da capital parisiense..) Carlos Laidevide dá a volta aos coreanos com uma desfaçatez notável. E conta, na sua carta oficial para a Universidade de Seul : “ Correndo o risco de contrair forte gripe, o presidente Soares salvou a vida, em 1 de Dezembro passado, a um jovem albatroz, arrostando para isso com grandes perigos. De facto, a ave fazia um voo rasante no Rio Tejo quando foi surpreendida por uma súbita tempestade.

Procurando refúgio, o albatroz foi irresistivelmente atraído pelas luzes resplandecentes do palácio presidencial (nessa noite, o dr. Soares presidia a um banquete em honra de Miss Cabrillo 86). Ofuscado pelo brilho cintilante de torrentes de diamantes e pedras preciosas, o jovem pássaro estatelou-se contra uma janela de Belém, partindo os vidros em mil bocadinhos e aterrando lamentavelmente no meio do banquete”.

E o mirabolante relato prossegue: “ Testemunha deste trágico acidente, Mário Soares não hesitou um segundo: libertou-se da mão de Miss Cabrillo e apressou-se a socorrer o pobre animal agonizante (alguns comentadores da imprensa, de forma algo sardónica, afirmaram na altura em que Soares teria mesmo executado um boca-a-bico socorrista, mas nós tomamos a liberdade de duvidar). O que é certo é que, mais tarde, o presidente fez questão de acompanhar pessoalmente a ambulância dos Sapadores- Bombeiros de Belém ao Hospital de Stª Maria, onde obteve dos médicos de serviço a promessa de que os primeiros socorros serial aplicados à pobre ave até ao fim desse mês”.

Mais: citando uma edição do jornal Expresso, de 15 de janeiro (quinta-feira), dia em que aquele semanário nem sequer entrara nas rotativas, o impagável Laidevide jura ao deão sul-coreano que “ na presença das mais altas autoridades religiosas, militares e civis, condecorou com a Medalha da Ordem do Mérito Trágico-Marítimo, toda a guarnição de bombeiros de Belém e dois dos médicos de serviço ao Banco de Santa Maria que puderam, finalmente, salvar a vida do jovem albatroz”.

Disposto a não dar ponto sem nó, Carlos Laidevide, assinando como presidente da Fundação Ocidental para a Defesa do Albatroz, sugere que a Universidade de Seul dê um brilho muito especial à cerimónia de doutoramento de Soares, cujo anúncio à imprensa internacional fizera pouco antes: E que tal se, na mesma cerimónia, se entregasse ao presidente português um prémio simbólico pela sua defesa do reino animal, isto é, o galardão F.O.D.A. d´Ouro/86? – pergunta ele. A graçola ficaria por aqui se os orientais não fossem gente de levar as coisas a peito. Mas…

Na volta do correio, a divertida F.O.D.A. recebeu de Jong Chul Soh, deão – assistente da Universidade de Seul, uma resposta em forma, datada de 19 de Maio de 1987 deste ano: 2 Ficámos felizes ao saber que o presidente da República Portuguesa, Doutor Honoris Causa da nossa Universidade, se tem distinguido na proteção dos animais. Contudo, antes de introduzirmos alterações no registo de méritos do presidente Soares, será necessário obter o seu acordo. Vamos por isso enviar uma cópia da sua carta à Presidência da República Portuguesa, e mal recebamos uma resposta positiva poderá avançar com o que for necessário”.

Uma sonora gargalhada acolheu, nos corredores do Palácio de Belém, a carta coreana e a cópia do incrível relato de Laidevide. Mas alguns “homens do presidente” mais dados à galhofa lamentam hoje que o estratagema tenha falhado: haveria de ser bonito ver a bochecha de Soares corar quando lhe anunciassem que, juntamente com borla e capelo, ia receber a notável, a disputada, a honrosa, a incomparável, a inultrapassável FODA d´Ouro 86!

Fica pr´a próxima, Laidevide…

 

Repórter T&Q

4/09/1987



26/08/2013
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