bocage, a empresa nocturna
A empresa nocturna
Era alta noite, e as beiras dos telhados
Pingando mansamente convidavam
A gente toda a propagar a espécie:
Brandas torrentes, que do céu caíam
Pelas ruas abaixo sussurravam:
Dormia tudo; e a ronda do Intendente
Que o grão Torquato rege, o pai das putas,
Esbirro-mor, Mecenas das tabernas,
Recolhido se havia aos pátrios lares.
Era tudo silêncio, e só se ouvia
De quando em quando ao longe uma matraca.
Soava o sino grande dos Capuchos,
Vão-se os frades erguendo, era uma hora.
Não podia faltar: Nise formosa,
Pela primeira vez m'estava esperando,
De repente me visto, e salto fora
Da pobre cama, onde envolto em sonhos
Mil imagens a mente me fingia.
Visto roupa lavada, e me perfumo,
N'um capote me embuço, a espada tomo,
Que nunca me serviu, mas que em tais casos
Mete a todos respeito; e qual Quixote,
Que, havendo já perdido o charo Sancho,
Sem nada recear de assalto busca
Altos moinhos, que valente ataca;
Tal eu figuro achar a cada esquina
Um Rodamonte, e pronto me disponho
A lançá-lo por terra, em pó desfeito.
Assim, gastei o tempo, até que chego
Ao sítio dado, onde meu bem m'espera.
Mal a porta emboquei, dentro em mim sinto
Um fogo activo, que me abraza todo.
Eis de Nise a criada, abelha mestra
Que à mira estava ali, a mão me aperta,
Vai-me guiando, e diz: «Suba de manso,
Que aí dorme a senhora.» A poucos passos,
Por acaso ao subir lhe apalpo as coxas...
Oh caspite! que sesso! Era alcatreira,
Nunca vi cu tão duro, era uma rocha.
Foi o tesão então em mim tão forte,
Que as mãos lhe encosto aos ombros, n'ela salto,
Que enfadada dizia: «Olhe o bregeiro!...
Tire-se lá, que pode ouvir minha ama!...»
Ao dizer isto a voz lhe fica presa,
Soluça, treme toda, estende os braços,
Aperta as pernas, encarquilha o cono,
Que distava do cu polegada e meia.
Qual moinho de cartas, que os rapazes
Em tempo de verão põem nas janelas,
Tal a moça rebola: e eu posto em cima,
Sem nada lhe dizer, tinha vertido
Na larga dorna a larga apojadura.
Acabada a função, em que a moçoila
(Segundo confessou) deu três por uma,
N'um quarto me encaixou, onde os Amores
Tinham sua morada, onde Cupido
Havia receber em seus altares
Em breve espaço meus amantes votos.
Dormia tudo em casa: eis Nise bela
Um pouco envergonhada, assim ficando
Mais vermelha que a rosa, a mim se chega,
Nos meus braços se lança: então lhe toco
No tenro e branco seio palpitante;
Trémula a voz, que o susto lhe embargava,
Mal me pôde dizer: «Meu bem, minh'alma,
«Quando pode o amor n'um peito firme!
«Bem vês ao que me arrisco: eu bem conheço
«Quanto ofendo o meu sexo, e as leis da honra
«Bem sei que despedaço!... Mas não temo
«Que te esqueças de mim, que ufano zombes
«D'uma infeliz mulher amante, e fraca!...»
Em quanto assim falava, me prendia
Nise c'os braços seus, e aos meus joelhos
As pernas encostava, que eu conheço
Pelo tacto, que são rijas, e grossas.
Mal podia conter-me: o céu chuvoso
Pelas telhas caía; o vento rijo
Pelas frestas zunia; a casa toda
Com cheiro de alfazema; a cama fofa,
Tudo em fim era amor, tudo arreitava,
Entro a beijar-lhe as mãos feitas de neve,
Descubro-lhe com jeito o tenro peito,
Que ansioso palpita, que resiste,
Que não murcha ao tocar-lhe; oh quanto é bela!
No seio virginal, onde dois globos
Mais brancos do que jaspe estão firmados,
Ancioso beijando-os, pouco a pouco
Se fizeram tão rijos que mal pude
Comprimi-los c'os beiços; n'este tempo
Pelo fundo da saia subtilmente
Lhe introduzi a mão, com que esfregava
O pentelho em redonho, o mais hirsuto
Que até'li encontrei; e como a crica
Vertido tinha já pingas ardentes,
Certos sinais que os fervidos prazeres
Dentro n'alma de Nise à luta andavam,
Tal fogo em mim senti, que de improviso
Sem nada lhe dizer me fui despindo,
Té ficar nu em pêlo, e o membro feito,
Na cama m'encaixei, qu'a um lado estava.
Nise, cheia de susto, e casto pejo,
De receio, e luxúria combatida,
Junto a mim se assentou, sem resolver-se.
Eu mesmo a fui despindo, e fui tirando
Quanto cobria seu airoso corpo.
Era feito de neve: os ombros altos,
O colo branco, o cu roliço, e grosso;
A barriga espaçosa, o cono estreito,
O pentelho mui denso, escuro, e liso;
Coxas piramidais, pernas roliças,
O pé pequeno... Oh céus! Como é formosa!
Já metidos na cama em nívea holanda,
Erguido o membro té tocar no umbigo,
Qual Amadis de Gaula entrei na briga:
Pentelho com pentelho ambos unidos,
Presa a voz na garganta, ardente fogo
Exalávamos ambos; Nise bela
Ou fosse natural, ou fosse d'arte,
O peito levantado, anciosa, aflita,
Tremia, soluçava, e os olhos belos
Semi-mortos erguia: a cor do rosto
Pouco a pouco murchava; era tão forte,
Tão activo o prazer, que ela sentia,
Que, cingindo-me os rins c'os alvos braços,
Tanto a si me prendia, que por vezes
O movimento do cu me embaraçava:
Co'as alvas pernas me apertava as coxas,
Titilava-lhe o cono, e reclinada
Quasi sem tino a languida cabeça,
Chamando-me seu bem, sua alma e vida,
Faz-me ternas meiguices, brandos mimos;
Férvidos beijos, mutuamente dados,
Anelantes suspiros se exalavam:
Era tudo ternura; e em breve espaço
Ao som de queixas mil, com que intentava
Mostrar-me Nise um dano irreparável,
Me senti quasi morto em todo o corpo:
Uma viva emoção senti gostosa
Dentro em minh'alma: férvidos prazeres
O peito vivamente me agitavam:
Os olhos, e a voz amortecida,
Os braços frouxos, quasi moribundos,
Lânguido o corpo todo, em fim mal pude
Saber o que fazia... Eis de improviso
Tornando a mim mais forte, e mais robusto,
Tentei de novo o campo da batalha:
Qual o bravo guerreiro, que se abrasa
No cálido vapor, que exala o sangue
Que ele mesmo espargiu entre as falanges
De inimigos cruéis, que vence, e mata;
Assim eu, abrasado em vivo fogo
Que de Nise saía, me não farto
Da guerra, que intentei: de novo a aperto,
De novo beijo os seus mimosos braços;
Beijo-lhe os olhos, a mimosa boca,
Os níveos peitos, a cintura airosa;
Nise outro tanto me fazia alegre,
Estreitava-me a si por vários modos:
Ora posto eu por baixo, ela por cima,
Para dar doce alívio aos membros lassos;
Ora posto de ilharga, sem que nunca
O voraz membro do lugar saísse,
Onde uma vez entrara altivo e forte,
O membro, que em tal caso era mais duro
Que alva coluna de marmóreo jaspe:
Até que em fim, depois de não podermos
Nem eu, nem Nise promover mais gostos,
O brando sono, sobre nós lançando
Os seus doces influxos brandamente,
Os olhos nos cerrou. Uns leves sonhos
Vieram animar nossos sentidos
Té que chegou a fresca madrugada,
Em que à casa voltei d'onde saíra;
E tornando outra vez à pobre cama,
Dormi o dia inteiro a sono solto.
Bocage
1765-1805
in "Poesias Eróticas, Burlescas e Satíricas"
Publicações Europa-América
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